|
Em
busca da verdade
Cibernética
ARTIGOS
SOBRE PERÍCIAS
O Papel do
Perito Judicial
A grande maioria das
perícias que são
impropriamente chamadas
de contábeis na verdade
são perícias
financeiras, envolvendo
a necessidade de que o
perito tenha
conhecimentos
aprofundados de
matemática financeira e
habilidade mínima com a
interpretação de
contratos e da matéria
legal em geral.
|
A participação do Perito
Judicial como auxiliar
da justiça (art. 139 do
C.P.C.) é de grande
importância na prestação
jurisdicional quando a
prova do fato depender
de conhecimento técnico
ou científico (art. 145
do C.P.C.). O Perito,
como todo ser humano, é
sujeito por todo o tempo
a reações e interações
com o meio.
|
Todos nós um impulso
devido à nossa formação,
hábitos e referências,
de tomar partido de
todos os eventos à nossa
volta, de uma forma ou
de outra, influenciados
por diferentes
motivações. Se isto
acontece em todos os
momentos do cotidiano,
quando enxergamos as
situações de maneira
polarizada, com muito
mais razão, consciente
ou inconscientemente, o
perito judicial pode ser
levado a inclinar-se
para uma ou outra tese
ou posição defendida em
um processo onde atua.
|
Há que se lembrar que a
própria instauração de
um processo estabelece
uma situação de
conflito, que a partir
dos posicionamentos das
partes e advogados nos
autos leva a qualquer um
que tenha acesso ao
processo uma carga
emocional forte, que
pode eventualmente
arrastá-lo a uma tomada
de posição, a um juízo
de valor. Além de
impregnar-se com a carga
emocional do conflito,
certamente estará
influenciado pelas
"verdades" interiores
adquiridas ao longo de
sua vida. O perito está
sujeito a cair nesta
armadilha ou em outras,
ou seja:
|
1. Sentir-se na
responsabilidade de
"decidir" o processo,
assumindo para si o ônus
da prestação
jurisdicional. Se os
quesitos conduzem a mais
de uma hipótese de
solução da controvérsia
e se a definição por uma
ou outra hipótese
depende de matéria de
direito deve o perito
apresentar em seu laudo
as diferentes
alternativas, com a
ressalva dos respectivos
aspectos influenciáveis.
Por mais que salte à
vista do perito qual
seria a hipótese
legalmente adequada,
deve ele apenas
apresentar todas as
possibilidades em seu
laudo, deixando para o
juiz analisar a matéria
legal, a interpretação
da lei.
|
2. Envolver-se
emocionalmente na
questão,
identificando-se com uma
das partes, encarnando
um preconceito contra
uma das partes, ou de
alguma forma deixando-se
influenciar e saindo da
posição de neutralidade
e imparcialidade que
devem ser qualidades
indispensáveis no
perito.
|
3. Premido pelo temor
reverencial em relação
ao Juiz, preocupar-se
excessivamente em
produzir um preciosismo
técnico, que em tese
ajudaria ao Juiz na
prolação da sentença,
mas na prática pode
colocá-lo numa situação
de impasse por não ter
sido devidamente
clarificada a matéria de
fato da especialidade do
perito.
|
4. Pressionado pela
responsabilidade de
fazer uma peça técnica
impecável o perito pode
acabar se afastando da
necessidade de se
expressar numa
linguagem, embora
abordando aspectos
técnicos, que seja
compreensível ao leigo
naquela ciência do
conhecimento.
|
Além dessas ciladas de
ordem subjetiva a que
pode sucumbir o perito,
está ele sujeito a não
compreender a real
natureza de sua função
como auxiliar da justiça
que em termos seria:
|
1. Procurar a verdade
dos fatos, colocando-se
de forma neutra e
imparcial.
|
2. Ater-se à matéria de
fato, da sua
especialidade,
negando-se a responder
quesitos que dela se
afastem ou que avancem
na interpretação de
matéria legal ou no
estabelecimento de
respectivos direitos,
matéria de apreciação
exclusiva do Juiz.
|
3. Compreender que mesmo
que os quesitos tomem
posições contraditórias
eles devem ser
respondidos, se
concernentes à matéria
técnica sob exame e se
não tiverem sido
expressamente
indeferidos pelo Juiz.
|
4. Conscientizar-se de
que, se do
questionamento dos autos
surgirem diferentes
possibilidades de
resultados de acordo com
a defesa de diferentes
teses vinculadas à
matéria de direito a ser
apreciada pelo Juiz,
deve o perito apresentar
as alternativas técnicas
aventadas, com as
devidas ressalvas de
aspectos técnicos (e não
de direito), relevantes
e eventualmente ocultos
nas defesas das teses
pelas partes.
|
É importante lembrar que
como Auxiliar da Justiça
e gozando da confiança
do Juiz que o nomeou,
tem o Perito o dever de
manifestar-se sobre
estes pontos ocultos não
revelados pelas partes
em seus quesitos, sob
pena de contribuir, por
omissão, com a prolação
de uma decisão
equivocada, por se
fundar em análise
técnica que não aborde
todas as variáveis
envolvidas.
|
A linha divisória entre
o limite até o qual pode
ir o perito e a partir
do qual terá que recuar,
é tênue, entretanto. A
vigilância tem que ser
constante pelo perito,
para que se movimente
nas fronteiras de suas
atribuições procurando o
ponto ótimo que melhor
esclareça as questões de
fato, sem adentrar,
contudo, na matéria de
direito ou em outras
especialidades que não a
sua.
|
Outro evento inquietante
para o perito e que
ocorre muitas vezes na
prática é que há
perícias nas quais as
questões suscitadas na
quesitação não atingem o
cerne da questão. As
partes se movimentam
pelas bordas, muitas
vezes pelo receio de que
indo ao ponto estariam
arriscando-se a abrirem
a guarda e tornarem seus
direitos mais
vulneráveis ao invés de
consolidá-los.
|
A conseqüência é que os
quesitos nesta hipótese
são formulados de
maneira a tocarem apenas
a superfície do conflito
ou a abordarem aspectos
que nada influem no
objeto da pretensão
colocada em Juízo. Neste
caso a cautela do perito
deve ser reforçada, pois
no ímpeto de ver
analisados os fatos
essenciais ao deslinde
da questão, pode acabar
extrapolando os limites
estabelecidos pelas
partes através da
quesitação.
|
Situação peculiar que
acontece regularmente é
a de processos que
parecem ao perito tão
claramente resolvidos
com o que consta dos
autos que ele não se
permite avançar na
investigação da matéria
de fato, limitando-se a
referendar determinados
pontos de vista que
entendem estarem
consolidados nos autos.
Exemplo típico é o das
ações fiscais, sejam
anulatórias ou
execuções, onde já se
percorreu um longo
trajeto na esfera
administrativa, através
de recursos e pedidos de
reconsideração que via
de regra já contemplaram
o princípio da ampla
defesa naquele âmbito.
Ocorre que quando se
instaura o processo
judicial, abre-se a
possibilidade de um
questionamento amplo
sobre todo o conteúdo do
processo tributário
administrativo. O perito
deve então abstrair-se
de todo o processado nos
autos administrativos e
dedicar-se a uma revisão
da matéria de fato desde
a estaca zero,
respeitando, é claro, os
limites colocados pelo
quesitos formulados e
limitando-se à área de
sua especialidade.
|
Os usuários da prova
pericial, principalmente
as partes através de
seus advogados,
colocam-se em relação ao
trabalho do perito do
Juízo de forma muitas
vezes hostil, quer
alegando parcialidade,
quer alegando ter ficado
"em cima do muro". Esta
reação é perfeitamente
natural, visto que as
partes exercem o seu
direito de alegar o que
quiserem na defesa de
seus interesses.
Entretanto, a partir da
análise dos aspectos que
levantamos linhas atrás,
pode-se perceber que o
munus pericial é muito
mais complexo do que
pode parecer a
princípio, não se
limitando à visão
simplista de que o
perito deve colocar-se
de acordo com uma ou
outra tese, favorável a
uma ou outra parte. Este
é o posicionamento
típico do nosso sistema
jurídico, mas que não
deve ser estendido ao
trabalho técnico de um
perito, a quem não cabe
dar razão a um ou outro,
mas apresentar somente
os fatos para que o Juiz
possa decidir.
|
O perito é o olho
técnico do Juiz,
cabendo-lhe a análise
desapaixonada da matéria
de fato, abstendo-se de
manifestar-se sobre
matéria de direito ou
fazer conclusões que
possam induzir em erro o
Juiz da causa, por
conterem juízo de valor,
mesmo que velado. Às
partes e ao Ministério
Público, se for o caso,
sob a presidência do
Juiz da causa, cabe
orientar o curso da
prova através de
quesitos objetivos que
removam a cortina de
fumaça existente sobre a
matéria de fato, não
imputando ao perito a
responsabilidade de dar
rumo definitivo à
solução do conflito.
|
|
Créditos: Gilberto da Silva
Melo
Site: http://www.gilbertomelo.com.br
Imprimir
|
|
|
|